Trabalhar é algo muito bom! O duro é ter ir e voltar do trabalho todo dia como uma bolinha de pingue-pongue vai e volta ao sabor dos golpes da pequenina raquete!
Estava eu outro dia a voltar do meu ganha-pão, dentro de um ônibus, de pé, coisa, aliás, muito comum nesta metrópole excessivamente povoada que é a Grande São Paulo. Os economistas dizem que a concentração de pessoas gera ganhos de escala que justificam a formação desse tipo de ambiente urbano. Discordo, uma vez que tenho de usar o busão e o metrô de segunda a sexta e não vivo de análises nem de teorizações econômicas. Mas, como estava dizendo, eu ía de pé e, ao meu lado, havia um banco ocupado por dois, como eu, "felizes" clientes do sistema de transporte metropolitano. Algumas paradas após o início da viagem a pessoa que estava sentada do lado do corredor levantou-se para descer do buso pra lá de coletivo deixando o assento vago. Não hesitei então e, mais rapidamente do que um elétron de oxigênio se desprende de sua antiga eletrosfera para se juntar a um novo elemento, repousei minha bolsa sobre o banco para aliviar o peso que sentia sobre meus ombros e também para guardar um livro que teimosamente havia estado a ler, a despeito da indomável e selvagem trepidação do veículo.
Enquanto dava conta da minha tarefa não notei que, atrás de mim, um ser, humano, ansioso, espreitava as minhas atitudes. Eu não havia ainda terminado de enfiar o livro na bolsa pois umas folhas de papel bloqueavam sua passagem. Resolvi então que tiraria as folhas antes de colocar o livro e depois as poria de volta a seu lugar. Estava exatamente no meio da consecução desse intento quando uma voz feminina interrompeu-me com um tom demandante: "Vai sentar?", ao que eu disse: "Não, fique à vontade." Ela, sem esperar que eu desocupasse inteiramente o lugar que, reconheço, deveria ser exclusivamente destinado ao solene descanso de nossos bumbuns, pôs seu desconhecido traseiro em processo de assentamento sobre o equipamento de repouso e, por tabela, em rota de colisão, melhor dizer esmagamento, de meus humildes porém dignos pertences. Tão rapidamente quanto percebi a inconveniência da grosseria removi minha bolsa, ainda com o livro e as folhas na mão, para salvá-la daquele que seria seu trágico final. Indignado e ofendido não me contive com tamanha afronta ao meu ser costumeiramente tão gentil e falei: "Não dava pra esperar? Eu já estava saindo!" No exato momento em que eu tive a absurda ousadia de proferir essas palavras a estranhíssima figura levantou-se num átimo, com o semblante completamente transtornado e já vociferando as seguintes palavras - eu gostaria aqui, caro leitor, de ser o mais direto e objetivo possível, mas também de me comprometer com você quanto à veracidade deste relato: que as almas dos meus antepassados voltem do além ou do aquém para me assombrar ad eternum caso eu esteja mentindo - ela disse, com o dedo em riste e vindo em minha direção: "Vai tomar no seu c..., seu filho da p..., te quebro os dentes!!!!". Amigo, se você já passou por uma situação desafiante como essa com certeza entenderá o que comigo se sucedeu. Tendo a dita cuja se aproximado tão perigosamente de minha pessoa e, ainda por cima, me ameaçado, não pude evitar ser tomado de fortíssima emoção. Talvez o instinto de sobrevivência tenha reacendido em mim a reação de fuga ou luta, que insiste em acompanhar o ser humano mesmo após a sua domesticação por si mesmo há dezenas de milhares de anos atrás. Neste caso, lutei. Tendo terminado já de falar e ainda com o dedo em riste a mulher agora me fitava com olhos odiosos, desferi-lhe então um soco certeiro na altura da boca do estômago. Diferentemente do que imaginara, aquele golpe foi mais do que suficiente para tirar da criatura toda a ação. Permaneci próximo à porta pois minha parada era a seguinte enquanto observava a mulher se contorcer e tentar buscar um fôlego que parecia nunca vir. Sua amiga tentava, com todo cuidado, acudí-la de alguma forma no momento em que me virei para ambas e disse: "Vem tentar quebrar alguma coisa aqui!" Como eu era observado com espanto por todos ao meu redor acrescentei em volume facilmente audível: "Que absurdo! Que desaforo!"
Estava eu outro dia a voltar do meu ganha-pão, dentro de um ônibus, de pé, coisa, aliás, muito comum nesta metrópole excessivamente povoada que é a Grande São Paulo. Os economistas dizem que a concentração de pessoas gera ganhos de escala que justificam a formação desse tipo de ambiente urbano. Discordo, uma vez que tenho de usar o busão e o metrô de segunda a sexta e não vivo de análises nem de teorizações econômicas. Mas, como estava dizendo, eu ía de pé e, ao meu lado, havia um banco ocupado por dois, como eu, "felizes" clientes do sistema de transporte metropolitano. Algumas paradas após o início da viagem a pessoa que estava sentada do lado do corredor levantou-se para descer do buso pra lá de coletivo deixando o assento vago. Não hesitei então e, mais rapidamente do que um elétron de oxigênio se desprende de sua antiga eletrosfera para se juntar a um novo elemento, repousei minha bolsa sobre o banco para aliviar o peso que sentia sobre meus ombros e também para guardar um livro que teimosamente havia estado a ler, a despeito da indomável e selvagem trepidação do veículo.
Enquanto dava conta da minha tarefa não notei que, atrás de mim, um ser, humano, ansioso, espreitava as minhas atitudes. Eu não havia ainda terminado de enfiar o livro na bolsa pois umas folhas de papel bloqueavam sua passagem. Resolvi então que tiraria as folhas antes de colocar o livro e depois as poria de volta a seu lugar. Estava exatamente no meio da consecução desse intento quando uma voz feminina interrompeu-me com um tom demandante: "Vai sentar?", ao que eu disse: "Não, fique à vontade." Ela, sem esperar que eu desocupasse inteiramente o lugar que, reconheço, deveria ser exclusivamente destinado ao solene descanso de nossos bumbuns, pôs seu desconhecido traseiro em processo de assentamento sobre o equipamento de repouso e, por tabela, em rota de colisão, melhor dizer esmagamento, de meus humildes porém dignos pertences. Tão rapidamente quanto percebi a inconveniência da grosseria removi minha bolsa, ainda com o livro e as folhas na mão, para salvá-la daquele que seria seu trágico final. Indignado e ofendido não me contive com tamanha afronta ao meu ser costumeiramente tão gentil e falei: "Não dava pra esperar? Eu já estava saindo!" No exato momento em que eu tive a absurda ousadia de proferir essas palavras a estranhíssima figura levantou-se num átimo, com o semblante completamente transtornado e já vociferando as seguintes palavras - eu gostaria aqui, caro leitor, de ser o mais direto e objetivo possível, mas também de me comprometer com você quanto à veracidade deste relato: que as almas dos meus antepassados voltem do além ou do aquém para me assombrar ad eternum caso eu esteja mentindo - ela disse, com o dedo em riste e vindo em minha direção: "Vai tomar no seu c..., seu filho da p..., te quebro os dentes!!!!". Amigo, se você já passou por uma situação desafiante como essa com certeza entenderá o que comigo se sucedeu. Tendo a dita cuja se aproximado tão perigosamente de minha pessoa e, ainda por cima, me ameaçado, não pude evitar ser tomado de fortíssima emoção. Talvez o instinto de sobrevivência tenha reacendido em mim a reação de fuga ou luta, que insiste em acompanhar o ser humano mesmo após a sua domesticação por si mesmo há dezenas de milhares de anos atrás. Neste caso, lutei. Tendo terminado já de falar e ainda com o dedo em riste a mulher agora me fitava com olhos odiosos, desferi-lhe então um soco certeiro na altura da boca do estômago. Diferentemente do que imaginara, aquele golpe foi mais do que suficiente para tirar da criatura toda a ação. Permaneci próximo à porta pois minha parada era a seguinte enquanto observava a mulher se contorcer e tentar buscar um fôlego que parecia nunca vir. Sua amiga tentava, com todo cuidado, acudí-la de alguma forma no momento em que me virei para ambas e disse: "Vem tentar quebrar alguma coisa aqui!" Como eu era observado com espanto por todos ao meu redor acrescentei em volume facilmente audível: "Que absurdo! Que desaforo!"
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