No começo era o superavit! Vida boa e farta, dinheiro suficiente para emergências guardado em vários tipos de aplicação, tranquilidade para gastar sem precisar ficar fazendo continhas minuciosas.
Então, de repente, também conhecido como "sem mais nem menos", o seu destino disse de forma solene: "Que se faça o deficit!"
E assim foi feito, do dia para noite sua vida virada de cabeça para baixo, você envolto num turbilhão de emoções extremamente desagradáveis sendo a elas subjacente esse conhecido ancestral (não é parente, hein!) do ser humano, o medo.
Num primeiro momento, e esta é a primeiríssima fase, entra-se num processo contínuo de acúmulo de dívidas, ou seja, aquela condição incômoda de se gastar mais do que se ganha e ter de bancar suas despesas usando recursos alheios, o famoso crédito. Famoso mas que, quando indesejado, está mais para famigerado mesmo!
Começa uma luta, que não é inglória e nem pode ser mas que é deveras desgastante, contra o relógio. Você sabe que a torneira do crédito, em algum momento durante esse processo, irá se fechar e ninguém, nem sua mãe em seu mais inspirador momento de generosidade e doação incondicional, lhe emprestaria algum sabendo que já estava enforcado em uma infindável fileira de pagagaios e pregos.
Você sabe que tem duas alternativas à disposição:
1) Reduzir despesas.
2) Aumentar sua renda.
Você pode usar a primeira, mais óbvia embora não necessariamente fácil e que tem a função adicional de fazer uma faxina em sua estrutura de gastos frequentes, muitas vezes inflada por dispêndios inúteis e ineficientes mais caracterizadores de um verdadeiro desperdício de recursos que poderiam ser mais bem aplicados em outras finalidades, tudo isso para o bem da sua vida e dos seus entes amados, caso os tenha.
Pode usar a segunda, mais desafiante mas que mostra maior capacidade de bancar ou "ganhar" a vida. Alguns evolucionistas a lá Charles Darwin diriam que você seria mais bem adaptado para a sobrevivência entre os seres humanos, o que não deixa de ser algo bastante bonito! Mas, meu caro provedor ou provedora, a desvantagem desta alternativa seria a de evitar a sempre providencial faxina citada no parágrafo anterior e perpetuar uma forma inadequada de uso de recursos, sempre tão escassos quando vistos de um ponto de vista mais amplo, ou coletivo, como quiser.
Pode também usar ambas ao mesmo tempo, se for incrivelmente hábil e sábio, o quê, sem dúvida, acelerará tremendamente seu processo de recuperação.
Felizmente, como disse acima, não se trata de uma luta inglória. Na realidade essa é uma luta que será inevitavelmente vencida por você pois é impossível ficar em deficit indefinidamente sem que as torneiras sejam fechadas pelos donos da bufunfa. E esse é um mecanismo de proteção a lhe ajudar por ser não somente em benefício dos credores, aqueles seus cruéis algozes (opinião sua, não me impute essa!) mas também em seu benefício, pois evita que seu estrangulamento financeiro dilacerante se encaminhe para algo mais sério e danoso ao seu patrimônio como a perda de um imóvel de moradia ou de um automóvel, por exemplo. É claro que, para que tudo corra bem (bem dentro do possível, logicamente, e considerando que você seja um típico desencanado, cabeça fria, ou melhor, estupidamente gelada) é necessário colaboração de sua parte não abandonando de uma vez por todas, entre outras coisas, o pagamento das prestações do financiamento imobiliário ou do automotivo. É preciso saber eleger as prioridades e deixar ao léo apenas aquelas dívidas que, caso fiquem para depois, não se voltarão contra você com olhos tão ferozes (eu escrevi ferozes e não vorazes como seria num texto mais clichê) quanto os dois tipos de dívida do período anterior costumam fazer com os incautos vacilões que os negligenciam.
E a que se refere o medo citado logo no começo desta despretensiosa exegese? Creio eu que a tudo que pode acontecer caso sua administração financeira simplesmente não seja eficaz. Noites de sono perdidas, pensando e sofrendo horrores quase reais de tão vividos no pensamento: imagens de pessoas batendo à sua porta em busca da devolução de seu dinheiro, de você recebendo telefonemas de agências de cobrança, do cheque da escola de seu filho sendo devolvido por falta de fundos, da sua dispensa vazia de comida e cheia de ácaros, da sua esposa pedindo-lhe para ir ao cinema com seu filho e não podendo por falta de grana, das pessoas em seu prédio lhe olhando de forma diferente porque você não paga o condomínio há mais de 6 meses, do seu carro deixando você a pé por falta de manutenção a cada pequena saída para ir à padaria, da sua geladeira mais deserta do que o polo norte e, finalmente, a mais aterradora de todas, a imagem da polícia executando a reintegração de posse de sua moradia. Uau, que lista! Hitchcock não faria melhor!
Esses são os medos, nem sempre tão fundados mas sua mera experienciação, por muito tensa, já configura sofrimento suficiente. Seja lá o que for que tenha acontecido na real, negativações no SERASA-SPC, cheques incluídos no CCF, entre outras coisas, você conseguiu passar pela primeira fase, eliminar seu deficit e acaba de ganhar sua entrada para a segunda fase.
E, desesperos ou desencanos à parte, chega-se a ela com toda a pompa e circunstância! Bem-vindo, agora você não é mais um f... (pode ler em voz alta se estiver sozinho que rima). Pelo menos é isso que você pensa imediatamente ao conquistar o superavit e parar de acumular as pegajosas dívidas.
É nessa fase que você terá de mostrar seu verdadeiro caráter e sua capacidade de ser despojado com relação a dinheiro. O dinheiro tenderá a apenas passar pela sua conta bancária para lhe dizer um brevíssimo alô antes de deixá-lo na saudade absoluta migrando para os bolsos mais acolhedores daqueles a quem você deve.
Sim, chegou a hora de ajustar as contas com quem lhe permitiu levar uma vida acima das suas possibilidades durante algum tempo! E o tempo, sempre tão discreto, exceto nos últimos anos quando tem corrido mais do que Usain Bolt, contraditoriamente é o rude portador de uma dura mensagem para você: pague agora ou pague depois com juros! Os juros andam de carona na boléia do caminhão tempo e ambos fazem entregas rápidas para aqueles que tem dívidas. Você simplesmente não pode recusar a encomenda.
Se na primeira fase você lutava heroicamente para eliminar o seu deficit na segunda terá de fazer seu superavit crescer o mais rápido possível, caso contrário terminará de pagar suas dívidas quando Matusalém estiver na 28ª reencarnação.
Qualquer melhoria na sua renda será rapidamente absorvida por prestações de composições de dívida ou pelo esfomeado do limite da conta corrente, aquele número ilusório que parece tão bonitinho e azul quando você olha de longe mas que visto de perto não passa de mais um número vermelho como todos os números que costumam aparecer na sua frente nessa sua vida de f... financeiro.
Ajoelhou tem de rezar, caloteiro foge é pra não pagar! Paga lo que deve, mi amigo. Saber pagar é uma virtude. “O pagamento dignifica o homem”! (Zé Bétio).
Pagas todas as contas, ou pelo menos a maior parte delas, mais uma vez, desesperos ou desencanos à parte, chega-se todo estropiado à terceiríssima íssima íssima terceira fase! Terceira fase?! Mas não era para agora você já estar completamente livre e posto de volta à situação inicial, “No começo era o superavit! Vida boa e farta …” blá, blá, blá? Que p(o/i)... é essa de terceira fase?!
Pode crer, vai na fé, truta, que o que eu digo é firmeza! Seu orçamento vai estourar que nem bexiga (de ar, mas pode ser a urinária também) em final de festa de aniversário e você não vai ter a mais pálida idéia do porquê!
Você vai brochar com sua primeira impressão: “Xii...! F...! Está acontecendo de novo!” E pode até vir a se desesperar ao pensar: “Não adianta, eu nunca vou sair dessa! Por mais que eu faça não consigo equilibrar essas contas! Desisto! Adeus, pai, adeus, mãe, adeus, Dona Encrenca (ou Senhor Encrenca, caso seja uma provedora casada), adeus, filharada, adeus, amigos, adeus, cachorro, adeus, gato, adeus, Timão (“Hã?!”), adeus, credores! Vou pra disney, trabalhar fantasiado de Pateta e Pato Donald, personagens que mais me cabem nesta vida de insucessos e desalento de um idiota como eu.”
Calma, não é bem assim! Em primeiro lugar você precisa esfriar a cabeça, caso já não a traga, por de costume, estupidamente gelada a -2,5 graus centígrados. Após refrigerar devidamente o coco dentro do qual se encontra a polpa encefálica (este texto está me dando uma sede!) você deve começar a analisar os gastos atuais com mais cuidado e atenção para perceber que, diferentemente do que estava a acontecer na primeiríssima fase, agora os dispêndios parecem ter realmente uma caracterísica diversa.
Não se trata mais de gastos recorrentes, ou seja, não é uma prestação de financiamento, ou a mensalidade do convênio médico ou até mesmo o salário da babá do seu filho. Trata-se meramente de uma reposição de estoques ou, como diriam os meus co-irmãos de profissão, os guarda-livros - ou contadores, se você for menos arcaico do que eu - são despesas de depreciação. “Como assim? Depreciação de quem, minha? Além de me depreciarem ainda tenho de pagar por isso?!” Calma, querídissimo leitor, não se ofenda ainda (aliás, não se ofenda nunca!), eu posso explicar.
Depreciação é o desgaste que as coisas que deveriam ser duráveis - deveriam por assim serem chamadas - sofrem com o mero decorrer do tempo. O seu carro sofre depreciação, o prédio que constitui a sua casa sofre depreciação, os eletrodomésticos dentro dela sofrem depreciação, seu guarda-roupas sofre depreciação, o armário de sapatos de uma mulher sofre depreciação (e como!), você sofre depreciação, eu também, os seus dentes e a sua saúde sofrem depreciação, até o seu consorte sofre depreciação - algumas pessoas não se conformam em apenas restaurar ou reformar o consorte e preferem substituí-lo por um exemplar mais novo.
Mas como perceber que a depreciação é real e não mera invenção das mentes guarda-livreiras ou economicistas? Simples, depois de anos sendo capaz de dispender dinheiro apenas suficiente para repor o mais urgente na vida de sua família como comida, água e energia elétrica, faça alguns dos testes que listo logo abaixo:
1) Abra uma porta qualquer de sua casa com força e verifique se não fica com um objeto em sua mão que poderia tranquilamente estar exposto em um museu com os dizeres: “Peça usada para abrir e fechar portas nas casas brasileiras. Século: XX. Origem: Doação anônima”.
2) Faça as contas e verifique quantas vezes, no último meio ano, você saiu de casa usando o seu carro e voltou de carona na boléia do caminhão-guincho.
3) Abra sua boca e a olhe no espelho, estime de quantas idas ao dentista você precisaria para que a residência oficial dos seus dentes saia do estado de petição de miséria.
4) Abra o seu guarda-roupa e verifique se há lá alguma peça que você já não tenha usado 1.584.423.548.119.999.387.592.223.547.544.882.939 de vezes.
5) Tente se lembrar de qual era a cor das paredes da sua casa quando da última pintura. Ah, e não olhe para as paredes propriamente ditas pois isso não vai ajudar em nada!
6) Tente se recordar da última viajem feita em família. Se preciso procure por fotografias antigas. Quando digo antigas talvez isso exclua as fotografias do tipo digital, por vários motivos.
Testou? Então você entendeu rapidinho! Agora é ficar tranquilo e, mais uma vez, fazer aquilo que você aprendeu a fazer como ninguém nas fases anteriores, ou seja, eleger prioridades, fazer o quê? É a vida! Aquela reposição de depreciação que for lhe f... mais rapidamente e melhor (melhor do ponto de vista dela mas pior do seu) caso não seja feita logo deverá ser a escolhida. Talvez a eleição de prioridades nesta fase seja um pouco mais difícil do que nas outras já que as necessidades não são tão urgentes nem tão aparentes e, além disso, há aqui um concurso de interesses tanto explícitos quanto escusos muito maior. Você vai sentir a pressão que vem de todos os lados. Seu cônjuge querendo uma coisa, seus filhos outras e seu trabalho clamando silenciosamente por terceiras coisas. Pode ser que sua mulher queira uma televisão gigante incrustada na parede que nem ouro no minério ou seus filhos implorem - e chorem - por aquela viagem para a Disney, seu trabalho pode estar dizendo: “vista-se melhor, sua batata está sendo assada com cuidado meticuloso e racionalidade empresarial após uma criteriosa avaliação dos riscos”(rs) - não sei porque algumas pessoas em algumas situações usam esse rs ou hehe ou háháhá após escreverem uma piadinha, afinal de contas, se o trecho era realmente engraçado o leitor dará sua própria risada, seja ela em voz alta seja interna. Será que se trata de algum tipo de ajuda especial para pessoas com dificuldade de dar risada?!
Bom, mas voltando à vaca fria - esta tem de ser fria mesmo e não estupidamente gelada como a cerveja citada acima - novamente será necessário ter muita paciência para aguardar que os investimentos feitos na reposição dos bens depreciados sejam feitos e você possa merecidamente comemorar a sua feliz passagem para a próxima fase. “O quê!? Que fase é essa!? Não me diga que há agora uma quarta fase que eu atravesso a internet pra te pegar seu cronista cachorro, filho de um animal equino do sexo feminino ...” Calma, leitor, desesperos ou desencanos à parte, é chegada a hora, rufem os pandeiros, requebrem as cadeiras, que os CDs de pagode cheguem às leitoras (de CD!), que comece um sambão bem brasileiro para comemorar a sua:
Tranquilidadeeee!!!!!!!! Uhuu, ihiii, yes, that’s it! De volta ao Português, por favor!
Aproveite que estará agora navegando em mares mais tranquilos para refletir sobre as enrascadas nas quais nos metemos nesta vida de vez em quando e, sejam elas evitáveis ou não, que nos sirvam sempre de preciosa lição e fonte de crescimento e amadurecimento para que possamos lidar com as adversidades de uma forma menos prejudicial e, pasme, mais proveitosa!
CRÔNICAS E HISTÓRIAS VERDADEIRAMENTE FALSAS, QUE PENA, OU MENTIROSAMENTE VERDADEIRAS, AINDA BEM!
terça-feira, 31 de maio de 2011
segunda-feira, 23 de maio de 2011
O Cúmulo do Egoísmo!
Hoje (23/05/11 12:30AM) estava ajudando minha esposa com a roupa que tinha de ser estendida no varal da nossa diminuta lavanderia apartamental quando comecei a ouvir umas explosões de fogos de artifício. Imediatamente pensei que pudesse ser algum traficante comemorando seus lucros em alguma boca não muito distante mas assim que olhei para o céu me deparei com um conjunto de luzes a viajar pela troposfera que mais pareciam um lustre desgovernado e muito brega!
Qual não foi minha não-surpresa quando reconheci naquele conjunto a figura desprezível e execrável de um balão de festa junina! "Meu Deus, estamos em 2011!", pensei. Por outro lado, pensei também, "estamos no Brasil!". Pobre país, pobre povo, tão carente de educação e de informação.
Mas o que é necessário para se pensar nos outros? Informação, dados de algum tipo, educação formal, programas governamentais, propaganda na TV, homília do Santo Padre, pregação de pastor, aula de catecismo, livro espírita, livro de autoajuda, livro didático, editorial de jornal de domingo, discurso do presidente da república, lavagem cerebral? Não sei, é difícil dizer o que leva alguém a um ato tão egoísta, pode até ser uma conjunção de fatores, para mim, impossível de imaginar. Sei que o grau de atenção necessário para pelo menos se desconfiar de que se está lidando com algo perigoso não deve ser muito elevado.
Senhor do céu tenha misericórdia dos pobres mortais daqui de baixo! Não permita, senhor do céu, que estes humildes seres viventes - que tudo que desejam é a paz, a vida, a felicidade, a segurança de seus entes queridos e filhos (muitas vezes pequeninos e indefesos) - sejam sequer chamuscados pelo fogo egocêntrico que se alastra e tudo consome ao cair derrotado pelos mesmos elementos naturais que antes o fizeram flutuar tenebrosamente sobre a cidade. Senhor do céu, ouça os clamores ...
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